sexta-feira, 5 de agosto de 2011

O REVERENDO NORTE-AMERICANO E A PADROEIRA DA PARAÍBA





Daniel Kidder, reverendo metodista que missionou no Brasil oiticentista.










Entre 1836 e 1842 o Reverendo metodista norte-americano Daniel Parish Kidder (1815-1891) viveu no Brasil, realizando atividades missionárias vinculadas à Sociedade Bíblica Americana. Em 1839 visitou as Províncias do Norte do Brasil, com o fito de divulgar seu trabalho. Retornando aos Estados Unidos, publicou logo após suas “Reminiscências de Viagens e Permanências no Brasil”.





Livro das viagens de Kidder pelo Norte do Brasil.






Passando pela cidade da Paraíba e seus arredores, deixou uma interessante descrição de seus aspectos urbanos e de sua vida social. Em 05 de Agosto daquele ano, acompanhando o seu anfitrião (a quem se refere como Sr. R.), participou das festividades da Padroeira Nossa Senhora das Neves. Seu relato, bastante negativo e eivado de diversos preconceitos próprios da época, não deixa de ser um importante testemunho, através da ótica de um estrangeiro, de como a cidade realizava sua maior festividade religiosa e profana e quais os distintos significados que poderiam estar associados á comemoração.

“Soubemos que naquela ocasião é que se realizavam as maiores festividades religiosas do ano, na Paraíba, pois no dia 5 de Agosto celebrava-se a festa de Nossa Senhora das Neves, padroeira da cidade. Perguntamos que santa era essa e apenas souberam nos dizer que essa Nossa Senhora é a mesma Nossa Senhora da Conceição, Nossa Senhora do Rosário e diversos outros nomes que dão à Virgem Maria! Duvidamos que a mitologia grega ou romana tivesse sido mais confusa. Essas festas, como todas as outras de grande importância, foram precedidas de uma novena, isto é, nove “rezas” realizadas em noites sucessivas. Em cada uma dessas noites havia um divertimento diferente, do qual se encarregava um cidadão que, naturalmente, procurava sempre exceder o outro na pompa e no brilho da festa a seu cargo. Convidaram-nos para sairmos à noite a fim de ver aquilo que achavam não poder deixar de nos ser profundamente interessante. A matriz, onde se celebrava a festa, ficava mesmo nas vizinhanças. Postamo-nos em uma das extremidades de um pátio oblongo. A frente da igreja estava iluminada por velas em lanternas quebradas, dispostas em torno da porta e à frente de uma imagem colocada em um nicho preso à cúpula. Grandes fogueiras ardiam em vários pontos do pátio. Em torno delas acotovelavam-se negros ansiosos por queimar baterias de foguetes e certos trechos dos atos litúrgicos que se realizavam na igreja. Terminada a novela, todo o povo acorria ao campo, para apreciar os fogos de artifício que se queimavam desde às nove horas até depois de meia noite. Os que tivemos ocasião de ver eram muito mal feitos. Não obstante, o povo se pasmava e aplaudia freneticamente. Se se tratasse de divertimento para africanos ignorantes, seriam mais compreensíveis essas funções, mas, como parte de festejos religiosos (em honra a Nossa Senhora Padroeira), celebrados em dia santificado e com a presença entusiástica de padres, monges e do povo, temos que confessar francamente que nos chocou bastante e teria sido melhor que não os tivéssemos presenciado.

Uma das mais penosas impressões que colhemos foi ver famílias inteiras, inclusive senhoras e senhoritas, ao ar úmido da noite, admirando cenas que não só tocavam ás raias do ridículo, mas, ainda, eram acentuadamente imorais – e dizer-se que tudo isso se fazia em nome da religião! Retiramo-nos prazerosamente logo que nossos companheiros se dispuseram a sair, com a firme resolução de jamais assistir voluntariamente, a tais profanações do dia do Senhor”
. (KIDDER, pp. 116-117).




Procissão das Neves nos anos 1970, vendo-se o Mons. Emiliano de Christo, autoridades e populares.
















Aspectos profanos da festa, nos anos 1970. Certamente teriam escandalizado ainda mais o Reverendo Kidder.

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